Entre os dias 18 e 20 de abril, Emancipação Socialista realizou a sua Conferência Nacional em São Paulo. Na pauta, pontos como situação política internacional e nacional, opressões, balanço político da nossa atuação no último período e os próximos passos no sentido consolidar a nossa organização.
Disponibilizaremos os textos aos interessados em conhecer nossas reflexões sobre a situação da luta de classes.
Uma etapa reacionária
O principal objetivo foi buscar compreender a correlação de forças entre as classes sociais e a partir dai elaborar a política e as táticas para a atuação na luta de classes.
Também avançamos para definir a atual etapa da luta de classes – considerando aqui desde a queda do Muro e dos Estados não capitalistas do Leste Europeu e a ascensão do neoliberalismo- como reacionária, período marcado pelo avanço de várias formas de exploração do capital (e em todos os países), retrocesso da consciência e a crise de alternativas socialistas. Duas observações: é diferente de “etapa contrarrevolucionária”, um momento no qual regimes abertamente ditatoriais seriam a tônica, prisões, fechamento sindicatos, etc. E a outra é que nesse período houve lutas e rebeliões importantes em vários países, mas estas não tiveram força para reverter tal correlação de forças.
Sobre os combates mais recentes contra a burguesia avaliamos que estamos em um momento de defensiva, no qual a classe trabalhadora encontra muitas dificuldades para reconquistar ou manter seus direitos. Luta, mas por várias razões – como o papel das direções pelegas – não consegue deter os ataques contra seus direitos.
Aprofundamento da crise estrutural e o colapso ambiental
Também identificamos o aprofundamento da crise estrutural do capital, conceito de Mészáros fundamental para entender as várias crises da atualidade (econômica, social, o colapso ambiental e o acirramento da disputa comercial). O significado prático é que todos esses problemas vão piorar e o capitalismo não tem um plano B, como foi o keynesianismo e o Estado-bem-estar-social que permitiram quase 30 anos de crescimento forte.
Para superar esse tipo de crise seria necessária uma gigantesca queima de capitais, possível só com uma nova grande guerra, mas não podem por conta do risco de uma destruição do planeta em função do aparato bélico atômico. Assim, a saída para o capital é ativar o modo destrutivo da produção: guerras locais, excesso de produtos supérfluos, utilização de fertilizantes químicos para aumentar a produtividade agrícola, etc. sobrecarregando a natureza e colocando a vida no planeta em risco, num processo que chamamos de colapso ambiental, a aproximação do ponto de irreversibilidade dos danos provocados pelo capitalismo no seu processo produtivo.
A crise da alternativa socialista e a extrema-direita
A realidade também é marcada por uma profunda crise de subjetividade da classe trabalhadora, que perdeu referenciais da luta e da esquerda anticapitalista, cada vez mais fragmentada, isolada social e politicamente e praticamente sem influência política sobre os explorados. É a crise de alternativas socialistas, um obstáculo importante para o desenvolvimento de uma consciência socialista no conjunto da classe trabalhadora.
Entre outras causas, essa crise abre espaço para a extrema-direita se apresentar (falsamente) como antissistema, influenciando a consciência de milhões de pessoas e ganhando respaldo para seu programa reacionário de perseguição aos imigrantes, de restrição às liberdades democráticas e vários ataques aos direitos sociais e trabalhistas.
Soma-se a isso o crescimento eleitoral da extrema-direita mundial, colocando para os revolucionários a importante batalha de derrotá-los a partir das mobilizações, como um contraponto às frentes amplas com setores burgueses, nas quais até mesmo um setor da esquerda anticapitalista embarca.
A classe trabalhadora luta
Mesmo com dificuldades e limitações, os explorados do mundo vão resistindo da forma que podem, se mobilizando em vários países: as greves nos Estados Unidos, as rebeliões populares no Quênia, Nigéria, Moçambique e Angola. Na Grécia, a classe operária realiza novas greves gerais e na Coreia do Sul, os metalúrgicos foram a vanguarda contra o golpe militar de Yoon Suk Yeol.
De todas as lutas, sem dúvida, a mais importante é a resistência do povo palestino contra os planos colonialistas do sionismo. Os ataques covardes contra Gaza mataram dezenas de milhares de pessoas, na Cisjordânia ocupada pelos israelenses os palestinos são presos aos milhares, inclusive crianças e jovens torturados nas cadeias. É uma luta da classe trabalhadora mundial contra Israel e contra os governos que apoiam essa chacina praticada pelo sionismo. Por isso, votamos que esse tema é uma das nossas prioridades políticas.
Todas essas lutas carregam o desafio de avançarem para pautas políticas contra o sistema e a tarefa dos revolucionários é ajudar a classe trabalhadora a desenvolver uma consciência socialista.
Situação nacional: o Brasil do agro, do rentismo, da vida cara e do governo de colaboração de classes
Associado a esse contexto internacional, na conjuntura brasileira temos o crescimento da extrema-direita, a volta ao poder de Lula e do PT alinhados à direita e respaldado por parte importante do capital através da ‘Frente Ampla’ e o ataque bolsonarista de “oito de janeiro”, elementos altamente explosivos e longe de uma ‘solução de estabilidade’.
Apontamos, entre outros fatores, que os ataques dos capitalistas sobre a classe trabalhadora, a crise da esquerda anticapitalista e a colaboração de classes desenvolvida pelas direções do movimento e o cenário internacional criaram as bases do fenômeno da extrema-direita no Brasil.
As classes dominantes seguem muito privilegiadas num país marcado por profundas desigualdades estruturais, pobreza, endividamento popular e carestia. O ‘agro’ e o setor financeiro são as frações dominantes nesse período, apesar da relativa recuperação da indústria. O colapso climático (elevação de temperaturas, chuvas torrenciais ou fortes secas, etc.) tende a agudização no próximo período e exige uma resposta classista e antissistêmica, como discutem, por exemplo, os ecossocialistas anticapitalistas da coalizão do clima.
Neste cenário, a classe trabalhadora enfrenta uma brutal precarização das relações de trabalho e redução sistemática dos direitos trabalhistas. Em que pese a redução conjuntural do desemprego no último biênio a situação geral é grave. Os empregos são precários e cerca de metade da população economicamente ativa tem trabalho informal que se expressa nos trabalhadores em app como i-food, uber, nas terceirizações e etc. Não por acaso estes setores têm se mobilizado e devem receber toda nossa solidariedade, unidade e apoio em suas lutas.
Este cenário de desmonte e precarização da classe trabalhadora se reflete especialmente na juventude, com a piora na saúde mental dos explorados e no crescente endividamento dos mais pobres. Neste duro quadro, a população periférica ainda convive com a constante repressão policial e a tendência é o Estado aumentar os investimentos nessa área. Ao mesmo tempo, a ação conservadora/reacionária das igrejas busca aplacar as insatisfações, resignar corações e mentes e, por vezes, criar discursos do ódio ao diferente especialmente no campo dos costumes.
Tal contexto não será revertido com as políticas do governo Lula 3 nem com as práticas tradicionais das direções do movimento social, pois trata-se de um governo burguês que aplica o neoliberalismo e se apoia na colaboração de classes. É também limitado por suas opções, pela correlação de forças e pela dificuldade de fazer concessões num cenário de um capital cada vez mais sedento por lucro. Chama atenção neste governo sua apatia nas iniciativas políticas e no enfrentamento quase zero aos desafios políticos e contradições. A receita amarga é a mesma desde a crise do impeachment de Dilma: ir a direita quando pressionado, ceder espaços ao ‘Centrão’ e até a extrema-direita.
Os dados relativamente positivos da macroeconomia (inflação, PIB, desemprego, etc.) não melhoram a aprovação popular, pois o alto custo de vida hoje é uma situação dramática e os números positivos ainda não chegaram na mesa dos mais pobres. O modelo de ‘austeridade fiscal’ do Haddad e seu reacionário arcabouço fiscal são os principais problemas desta conjuntura econômica, combinado com a manutenção das altas taxas de juros pelo Banco Central majoritariamente indicado por Lula.
Por tudo isso, definimos que uma das tarefas urgente e necessária é a construção de uma oposição de esquerda ao governo Lula, se diferenciando da oposição reacionária. Somente uma jornada de lutas da classe trabalhadora, dos precarizados e dos mais pobres pode reverter as dificuldades que vivemos no Brasil.
A unidade dos revolucionários e a construção do MFSR
Nesse ambiente de múltiplas crises e a impossibilidade do capitalismo conceder algum benefício, a tendência é o agravamento das condições de vida do povo. Não há saída dentro do capitalismo, nem mesmo com esses governos e suas versões reformistas e de esquerda eleitoral. Só a classe trabalhadora organizada e a Revolução Socialista mudam essa sociedade.
Mas sabemos das dificuldades da concretização da Revolução nesse momento. Exatamente quando ela é mais necessária encontramos tantos obstáculos e a esquerda anticapitalista bastante fragilizada.
Nós, da Emancipação Socialista, ao mesmo tempo que batalhamos pela nossa construção e fortalecimento, também defendemos a construção de espaços unitários da esquerda revolucionária para intervir na luta de classes. É nesse sentido que apostamos na construção do Movimento por Frente Socialista Revolucionária em base aos princípios da independência de classes, democracia operária e outros, e se organizando por consensos entre as forças políticas e os indivíduos que a compõem.
Plano de formação
Outra resolução que destacamos é o plano de formação para o próximo período: as formas de comunicação com a classe trabalhadora (jornal e redes sociais), o identitarismo na perspectiva marxista, um plano de estudo sobre a Guerra Civil espanhola e a ‘Escola Nacional’ de formação a ser realizada em 2026. Todas essas formações serão abertas aos ativistas.
A formação política da militância é muito importante, para melhor compreendermos a realidade e elaborar a política da organização. Também é uma forma da militância romper com a alienação muito presente nos ciclos da esquerda. É como Lênin dizia “sem teoria revolucionária, não há movimento revolucionário”.