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Conferência 2025 – Documento sobre situação nacional – Abril de 2025

21 de julho de 2025
in Conferência
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Introdução

 

Este documento, aprovado com muitos adendos que o tornaram mais completo reflete um esforço de analisar, problematizar ou ao menos listar temas de fôlego da realidade brasileira. É uma tentativa de armar a atuação da militância da ES e, ao publicá-lo, também contribuir com o debate na esquerda socialista como um todo.

Aqui se busca apontar mais do que um debate conjuntural (que também é necessário que façamos), mas discutir as profundas mudanças que se operaram na classe trabalhadora brasileira e na população pobre ao longo dos últimos anos e também as que ocorreram no interior da classe dominante e do seu Estado.

Somente o debate destas mudanças permitirá a ES uma melhor localização na classe trabalhadora no sentido de participarmos objetivamente dos seus processos de luta e resistência, além de ser parte da construção das condições subjetivas visando à superação pelo proletariado e pelos seus aliados do Estado burguês brasileiro.

É central que entendamos a conjuntura brasileira associada ao contexto internacional, o que exige partir das definições basilares nesta Conferência de que vivemos uma situação defensiva com elementos reacionários dentro de uma etapa histórica reacionária. Assim, foi este cenário a base que permitiu na recente conjuntura brasileira o crescimento da extrema-direita, a volta ao poder de Lula e do PT – com alianças mais à direita e respaldado por parte do Capital, através da Frente Ampla – e situações como o ataque bolsonarista de “oito de janeiro”. Com todas as contradições, sendo um processo vivo e de múltiplas possibilidades, a correlação de forças, em relação aos interesses dos trabalhadores e dos de baixo, segue desfavorável.

Apontamos, preliminarmente, que a contrarrevolução econômica permanente sobre a classe trabalhadora, a partir da década de noventa, e a colaboração de classes desenvolvida pela maioria das direções de esquerda criou as bases do fenômeno da extrema-direita, entre outros fatores. Junto a isso, as classes dominantes seguem muito privilegiadas num país marcado por profundas desigualdades estruturais e crônicas.

Dentro da ampla classe dominante, o agro e o setor financeiro se tornaram os setores mais fortes no último período, mesmo com o recuo conjuntural do agronegócio que registrou em 2024 uma queda de 3,2% na comparação com o ano anterior, quando teve uma alta recorde de 16,3%. Tal resultado dificilmente indica uma tendência de longo prazo, mas uma queda conjuntural e se justificou por problemas climáticos, a escassez hídrica e as enchentes no Rio Grande do Sul: a previsão é de uma safra gigante para este ano. De fato, o colpaso climático que acompanha a tendência internacional é um fator limitante que acompanha o agro como atividade produtiva, pois as enchentes, elevação de temperaturas e chuvas torrenciais não contribuem com a atividade agropecuária em boa parte do país.

Ao lado disso, o Brasil é o paraíso do rentismo com amplas garantias estatais e não é à toa o apoio de parcela da ‘Faria Lima’ à Frente Ampla, pois é um setor politicamente heterogêneo embora unido em seus interesses gerais. O arcabouço fiscal de Haddad, substituto do antigo teto de gastos de Guedes, mantem os objetivos centrais de seu modelo anterior pois garante o pagamento da dívida pública – entre outros fatores, como o garrote para o crescimento de investimentos – que ocupou quase 43% do orçamento federal em 2024 ou cerca de R$ 2 trilhões. 1 Um valor estratosférico em juros e amortização e arrochante em relação aos compromissos sociais que tendem a asfixia, pois tal sistema/engrenagem é a base justificadora para cortes sociais na saúde e educação e/ou uma próxima reforma previdenciária que penalize os trabalhadores.

Tal descalabro permite que o governo federal mexa em áreas como o BPC e na valorização do miserável salário mínimo – aprovado ao final de 2024 no legislativo – no esforço de demonstrar-se como um bom moço para a banca nacional e internacional. Isso tudo num país com parcela significativa da população vivendo na pobreza ou pobreza extrema. 2

O terceiro setor dominante, a indústria, cresceu 3,3% em 2024, uma contratendência do último período marcado pela desindustrialização. Também apontamos, como caracterização, que tal resultado não reverte a tendência de longo prazo de redução das atividades industriais. Todos os setores da área mostraram alta: construção (+4,3%); indústria de transformação (+3,8%); eletricidade, gás, água e esgoto (+3,6%); e indústria extrativa (+0,5%). Mais adiante aprofundamos a análise sobre esta área da economia.

Outro elemento decisivo que entrou na vida nacional e exige posicionamentos políticos são as consequências do colapso ambiental, representado centralmente pela enchente no RS em 2024, mas sentidas cotidianamente em boa parte do país com situações climáticas absolutamente novas – altas temperaturas, seca ou enchente – que tendem a agudização no próximo período e exigem uma resposta classista no espírito já discutido pelos ecossocialistas anticapitalistas da coalizão do clima, por exemplo. A COP 30 que se realiza em Belém – num momento no qual o governo federal tem a audácia de sugerir a exploração de petróleo na foz da Amazônia com argumentos absurdamente esdrúxulos – será importante para ação e debate político relativo ao tema ambiental que se hierarquiza cada vez mais em sua importância.

A partir deste panorama, apontamos nas próximas páginas as principais tendências da situação nacional atualizando e agregando elementos necessários desde a última Conferência realizada em 2023.

 

Desindustrialização e precarização do trabalho

 

Nos anos oitenta, o setor industrial era o mais dinâmico da economia brasileira, fomentado por políticas públicas dominantes entre as décadas de 1930 e 1980. A partir da eleição do governo liberal de Collor de Mello e do desmonte do mundo bipolarizado com a derrocada das economias planificadas do Leste Europeu – e a consequente restauração capitalista posterior – o processo de desindustrialização na economia brasileira deu o impulso definitivo.

O fechamento de milhares de fábricas e setores ou diminuição drástica dos trabalhadores formais no setor industrial e em setores importantes dos serviços como no sistema bancário, por exemplo, veio acompanhado da privatização de dezenas de estatais, iniciadas por Collor e prosseguidas por Itamar Franco – deram um salto de qualidade nos governos tucanos – e foram mantidas pelos governos petistas, de Michel Temer e de Jair Bolsonaro.

Na última década, a diminuição do setor industrial se agravou, reforçadas pela pandemia da COVID-19, como mostram os dados apontados pelo IBGE que somente nos últimos dez anos houve a redução de 9.579 empresas e 1 milhão de vagas no Brasil neste segmento. Na divisão internacional do trabalho, ao longo de diversos e distintos governos, aprofundou-se o perfil do Estado brasileiro enquanto um país produtor de commodites e de uma economia dependente dentro do capitalismo mundial. O ano de 2024, como já descrito, foi um ponto parcialmente fora desta tendência.

Pelo contexto na qual está inserida, a desindustrialização é um fator regressivo e reacionário por não oferecer uma forma societal superior. Não se trata de defender a indústria como um ideal de vida, algo já superado especialmente pela degradação ambiental, mas entender o cenário objetivo no qual ela ocorre.

 

A situação da classe trabalhadora

 

Esse ataque desferido contra o proletariado industrial não se restringiu a ele, que diminuiu qualitativamente de tamanho, mas é uma transformação global centrada na precarização das relações de trabalho e na redução dos direitos trabalhistas fundamentais. Em que pese a redução conjuntural do desemprego no ultimo biênio – tema analisado mais a frente – a situação geral é grave. Cerca de metade da população economicamente ativa trabalha em informalidade – em maior ou menor grau – e isso se destaca com a multiplicação dos trabalhadores em app como i-food ou uber, nas terceirizações e etc, mas também em inúmeras atividades tradicionais dos serviços e na produção.

Esse quadro de desmonte e precarização da classe trabalhadora se reflete também na juventude. Até a década de 1980, ter uma profissão, seja de nível superior ou de nível técnico, era um caminho que dava relativa segurança para o jovem encarar o mercado de trabalho e não ficar no exército industrial de reserva. Hoje, parte da juventude está no estilo “nem-nem”, ou seja, nem estudam nem trabalham. Não acreditam que valha a pena encarar um trabalho precarizado e de baixa remuneração e nem vislumbram que a educação formal seja um ‘caminho’.

Soma-se a isso que o Brasil vive uma crise de saúde mental – quase uma endemia ou epidemia, metaforicamente – com impacto direto na vida cotidiana dos trabalhadores. Em longa reportagem do G1, a partir de dados do Ministério da Previdência Social, sobre afastamentos do trabalho por saúde mental foi revelado que no ano 2024 foram quase meio milhão de atestados para afastamento laboral, o maior número em pelo menos dez anos. Os transtornos mentais chegaram a uma situação incapacitante como nunca visto e na comparação com 2023, as 472.328 licenças médicas representaram um aumento de 68%.

Tal adoecimento se relaciona às condições de trabalho, falta de perspectiva societal, a vida insalubre nas grandes cidades, horas de deslocamento para chegar ao trabalho, o colapso climático e as dificuldades cotidianas de uma sociedade endividada, pois cerca de 74 milhões de indivíduos estavam inadimplentes em janeiro de 2025, segundo o SERASA, uma alta de 1,48% em relação a dezembro de 2024.

Os brasileiros com idades entre 41 e 60 anos representam a maior fatia da população com nome restrito, sendo 35,1%. Na sequência estão as faixas etárias de 26 a 40 anos (34%), acima de 60 anos (19,2%) e os jovens entre 18 e 25 anos (11,8%). Em média, as dívidas não são de altos valores, pois o valor médio de cada acordo realizado foi de R$ 676,00 neste período, o que revela as imensas dificuldades de boa parte da população, considerando que ter o ‘nome limpo’ é uma questão central para as pessoas que consomem via crédito ou parcelamento.

Neste último período da luta de classes também merece destaque ao menos dois fatores: primeiro, a entrada definitiva dos trabalhadores dos app como classe que luta, ao menos nos grandes centros do país. Exibindo lideranças e algum grau de organização coletiva realizaram protestos como o ‘break’ dos app construído por fora dos sindicatos tradicionais. Já existem inúmeras experiências organizativas deste setor e cabe cada vez mais atenção, solidariedade e participação nestas lutas de nossa parte. Estamos bem atrasados nesta elaboração e consequentemente na devida ação militante neste setor. Tal cenário representa diretamente a consequência do que temos analisado na economia e nas mudanças do proletariado.

O segundo fator foi a popularização da luta do ‘6×1’, demonstrando como um tema – centralmente sobre direito dos trabalhadores – pode ter ainda muito espaço na conjuntura. Mesmo a partir de uma ação parlamentar da deputada Hilton, rapidamente a discussão se alastrou pela sociedade quebrando, em certo sentido, a polarização política. Mesmo bolsonaristas tiveram que reconhecer a proposta e alguns a defenderam com veemência. Sabemos que isolada no parlamento tal PEC não vai avançar, pois para isso seria necessária uma mobilização geral e ampla dos trabalhadores. Até o momento o VAT, também algo constituído por fora dos sindicatos, se coloca como liderança de tal pauta muito progressiva – redução e reorganização da jornada de trabalho. O VAT tem inúmeros problemas e limites pela sua estrutura ultraburocrática e personalista, mas é a liderança objetiva de tal movimento.

Ambos fatores acima destacados – trabalhadores dos app e luta contra a escala 6×1 – não podem estar fora da elaboração cotidiana nem da política e ação dos marxistas revolucionários.

 

Greves e sindicatos tradicionais

 

Tomando por base o ano de 1989, quando foram registradas 3.926 greves e o maior número de grevistas da série histórica iniciada em 1978, nos últimos anos o Brasil teve o seguinte quadro:

 

Ano nº de greves
2019 1074
2020 580
2021 721
2022 1067
2023 1132
2024 451

(1º semestre)

 

No ano de 2023, os trabalhadores do funcionalismo público promoveram mais da metade (51%) das mobilizações e 56% das greves encerraram-se no mesmo dia em que foram deflagradas, enquanto 12% das mobilizações duraram mais de 10 dias. Mais da metade (52%) das greves referia-se à denúncia de descumprimento de direitos e 21% das greves estavam relacionadas à melhoria das condições de trabalho. Já em 2024, 55% das greves foram promovidas por servidores públicos (porcentagem semelhante ao ano anterior) e 80% das greves tiveram um caráter defensivo, ou seja, buscavam evitar a perda de direitos conquistados e para manter as condições de trabalho vigentes. Especificamente no setor da educação, 43 greves foram registradas e na Saúde, oito greves envolveram principalmente profissionais da enfermagem, mas também médicos. Na Segurança, oito greves foram deflagradas por policiais civis.

O quadro acima revela um recuo pelo qual passa a classe trabalhadora, se comparamos com períodos mais combativos onde víamos e participávamos de greves por conquistas. Vivemos um longo período de defensiva em função do receio do desemprego, pela flexibilização das relações de trabalho, pela colaboração de classes dos seus dirigentes e pela precarização. Os dados demonstram que o número de greves nos governos Bolsonaro e Lula se mantém muito semelhante, reduzindo drasticamente, por motivos óbvios, nos dois anos de pandemia. Cabe analisar o perfil das mobilizações, estilo da greve e impacto real na base.

Junto a isso, as taxas de sindicalização, na última década, demonstram importante recuo. Se em 2012, havia 14 milhões e 203 mil sindicalizados (16,1% da classe trabalhadora, um número já baixo naquele ano), em 2017, esse percentual caiu para 14,4%. Com a Reforma Trabalhista (2017), chegamos em 2019 a 10 milhões e 567 mil trabalhadores sindicalizados, um percentual somente de 11,2%. Cada vez mais os sindicatos tradicionais perdem seu peso de interferir na realidade social e muitos deles se resumem a um aparato controlado por determinada força da burocracia ou da pelegagem. Conta-se nos dedos sindicatos realmente combativos que fazem a diferença para as suas bases de atuação.

A situação de contínuo enfraquecimento das entidades sindicais se somou à adaptação ao liberalismo e ao regime democrático burguês por parte das suas direções majoritárias, em particular, o PT e a CUT, e em um lugar mais secundário, o PC do B e o PSOL. Foi assim destacadamente a partir dos anos 1990 quando inicia o discurso da substituição do conceito de classe trabalhadora pelo conceito do ‘cidadão’, passando pelas câmaras setoriais, pactos sociais, enfim… o ‘sindicato cidadão’, que na verdade se configurava como um modelo social democrata de atuação sindical. Nele não havia – e não há ainda – espaço para organização de base com autonomia nem para grandes mobilizações de massa.

Tudo isso convergiu para a democracia eleitoral, onde o PT se tornou, em trinta anos, uma potência, agora com uma quinta vitória para presidente junto a um importante espaço institucional no estado burguês. Milhares de bons cargos e posições para uma militância ‘sedenta’ em tempos difíceis para se conseguir um bom emprego.

 

Os trabalhadores do campo

 

Nos último século o campo brasileiro passou por grandes transformações que abarcam aspectos demográficos, produtivos, gestão, espaço agrícola, entre outros. Nesse período, a ocupação do espaço rural saltou de pouco mais de seiscentos mil para cerca de cinco milhões de estabelecimentos agropecuários. O número de trabalhadores ocupados decresceu a partir de meados dos anos 1980 refletindo as mudanças também ocorridas na area industrial e de serviços. Este decréscimo leva a redução do número de trabalhadores de 23 milhões (anos 1980) a pouco mais de quinze milhões em 2017. A quantidade de mão de obra por estabelecimento também mudou fortemente: de 5,3 pessoas por estabelecimento em 1940, reduziu para 3,0 pessoas em 2017.

A redução do número de trabalhadores ocorreu devido ao intenso processo de tecnificação da agropecuária brasileira (mais máquinas, recursos genéticos e insumos industriais) o que multiplicou a produção com menos gente empregada: em 1980 a produção de grãos no país era de cinquenta milhões de toneladas e hoje chega acima dos 295 milhões de toneladas (safra 2023/2024).

Em 1980, a área cultivada com grãos era de quarenta milhões de hectares, e em 2024 de 79 milhões de hectares, isso demonstra que neste período a área cultivada quase dobrou e a produção sextuplicou, mas o número de estabelecimentos permaneceu praticamente o mesmo e o pessoal ocupado diminuiu expressivamente. Houve uma expansão da area rural produtiva e isso ocorreu mais ou menos paralelamente ao período de expansão industrial pós Era Vargas.

Segundo os dados da PNADC, o número de trabalhadores que tem o setor agropecuário como atividade principal continua caindo: mais de dois milhões deixaram esta atividade entre 2012 e 2023, caindo para 8,1 milhões de ocupados. Retirando o ano de 2020 que foi o de crise da pandemia da Covid-19, a tendência é de queda mesmo sendo anos de recordes sucessivos de safras de grãos. Ou seja, a tendência de produzir cada vez mais com menos trabalhadores ocupados, continua. A tendência também de precarização ocorre no campo, com trabalhadores temporários sendo cerca de metade da mão de obra, retirando o trabalho familiar deste cálculo. 3

O MST segue sendo o movimento mais expressivo nacional. Inclui pessoas que lutam pela terra, assentados e todo aparato que cerca tal espaço produtivo: os números mais recentes demonstram que o movimento tem cerca de 450 mil famílias assentadas e 90 mil famílias acampadas, organizadas em 24 estados. São números expressivos. Na área produtiva, os assentamentos do MST são grandes produtores agrícolas, com mais de 160 cooperativas, 120 agroindústrias e 1900 associações.

O MST realiza e participa de uma grande quantidade de ações em defesa da reforma agrária, incluindo ocupações de terras e ações de apoio a outras organizações sociais e tem ações em todas as regiões do Brasil, com destaque para o Nordeste, onde há maior concentração de assentamentos e acampamentos. Vale destacar que existem outros movimentos pela terra atuando no Brasil como o MLT e MTL.

O MST conseguiu a formação de 8 mil assentamentos e a criação de escolas públicas dentro destes e se destaca na doação de alimentos, como arroz, açúcar, leite e outros, para regiões em situação de crise ou para ações de combate à fome. O movimento tem escolas de formação, congressos e atua em espaços de comércio como mercados, feiras, grupos de consumo e em programas governamentais, como o PNAE e o PAA. Na ação política recente, em 2023, o MST registrou 254 ações, sendo 59 relacionadas a ocupações de terras que resultaram na formação de 20 acampamentos já sob o governo Lula 3. 4

Mesmo sendo um apoiador do governo, o MST tem mantido uma linha de críticas e exigências, como se percebe em discurso de Stédile no ano passado: “O governo Lula é um governo encalacrado. Ou seja, mesmo que tenha vontade política de ajudar os pobres, não consegue (…) Não vou contestar os dados do Paulinho [ministro Paulo Teixeira], porque esse não é o objetivo. Mas a reforma agrária está parada, não houve nenhuma desapropriação em dois anos. Há boa vontade para resolver no ano que vem, tudo bem, há boa vontade. Mas o balanço é negativo”. 5

Vale reforçar que ministros de Estado estavam no evento do Movimento, o que não impediu a cobrança a partir de seu dirigente máximo. A estrutura bastante vertical e burocraticamente centralizada dificulta – mas não impossibilita – rupturas mais expressivas como percebemos em correntes políticas. O Movimento tem feito mediações e mantêm uma aparência de afastamento e crítica combinada ao apoio político, sem deixar, sendo justo, de realizar ações de ocupações durante os governos que apoiam. Mesmo que esteja distante de nossa atuação cotidiana, entender as dinâmicas do campo brasileiro considerando o papel do ‘agro’ na politica brasileira (tema desenvolvido neste documento) é fundamental na análise do contexto nacional.

 

Repressão física, psicológica e moral: as igrejas, o encarceramento e o aparato militar

 

O aumento de miséria e os aspectos centrais da crise estrutural do capital exige por parte do Estado brasileiro a ampliação do aparato repressivo. Mais de um milhão de pessoas integra as FA (Forças Armadas) e as polícias em todo país.

Ainda existe a atuação das forças militares não regulares, formada basicamente por ex-policiais e bombeiros militares – as chamadas milícias – que impõe o terror às comunidades pobres, construindo assim poderosos negócios, sob o pretexto de combate ao tráfico, ao banditismo e ao lumpensinato organizado. Todo esse quadro faz com que os lugares mais pobres vivam em estado de sítio permanente. A democracia burguesa brasileira cada vez se torna mais limitada aos dias de eleições e não existe no interior das comunidades e favelas, as quais sofrem até mesmo com repressão às suas manifestações culturais. A política contínua de encarceramento, principalmente, de pobres, pretos e pardos, elevou o número de encarcerados – em meados do ano passado – a 888 mil pessoas, sendo cerca de 663 mil em presídios (existem modalidades como prisão domiciliar, tornozeleira eletrônica e etc).6

As mudanças legislativas do ano passado que aumentaram a tolerância com o porte de maconha podem alterar estes números no próximo período, visto que 24% dos presos tem como crime o tráfico de drogas, ou seja, é uma consequência da chamada ‘guerra às drogas’. Precisamos incluir na politica da organização pautas como descriminalização, legalização, antirracismo e abolicionismo penal perante o tema.

Nas prisões, os homens são mais de 96% dos detentos. A população carcerária brasileira é a 3ª maior do mundo em números absolutos: apenas os EUA, com 1,76 milhão de presos, e China, com 1,69 milhão, têm mais presidiários. 7 Diferente da campanha da extrema direita pró-encarceramento, cerca de 30% desta ampla massa ainda aguarda audiência de custódia e, muito menos, não tiveram o devido julgamento. Geralmente, depois de soltos estes ex-presos quando não reincidem no crime engrossam o exército industrial de reserva e são obrigados a se sujeitar a qualquer emprego precarizado. Em síntese, as forças de repressão convencionais e não convencionais fazem uma divisão de tarefas com as Igrejas, no sentido do controle social, moral e psicológico e da imposição de um Estado de sítio permanente sobre os setores mais pauperizados do proletariado brasileiro.

No controle moral, mas também ideológico, encontramos as igrejas evangélicas, especialmente as neopentecostais. Importante incluir a direita católica e suas diversas manifestações muitas vezes ligadas a grupos jovens até de ‘rock’ cristão ou o exemplo do chamado Centro Dom Bosco (CDB), uma organização católica conservadora (sede no RJ), fundada em 2016 por universitários católicos: o CDB se coloca como um polo do conservadorismo católico no Brasil e foca em “re-cristianizar” o país.

Neste contexto cristão conservador, o fenômeno evangélico se destaca amplamente, pois em 1970 este credo representava 5% dos brasileiros e hoje totalizam 70 milhões, ou 30% da população brasileira, num ritmo crescente. Dados do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), mostram que em 2017, havia 21.333 CNPJs ativos de organizações religiosas. Dessa forma, o Estado brasileiro (o mesmo que atacou as entidades sindicais com a Lei nº 13.467/2017), permitiu o surgimento de novos “bispos” e “pastores”, através da Instrução Normativa RFB 1.897/2019, na qual as Igrejas foram dispensadas da necessidade da obtenção do CNPJ, desde que sejam administradas por uma igreja matriz.

O salto qualitativo das Igrejas evangélicas foi concomitante à intensificação do ataque que a classe trabalhadora vem sofrendo no Brasil, desde 1990, ao seu consequente embrutecimento físico e intelectual e se combina com o desmanche do frágil esboço de ‘Estado de bem estar social’ brasileiro.

As Igrejas evangélicas, além de trabalhar ideologicamente amplos setores do proletariado com o seu discurso de resignação frente à barbárie que os cerca nos seus locais de residência (milícias, tráfico, miséria, destruição dos poucos serviços públicos), criam redes de solidariedade entre os mais pobres. Ao mesmo tempo, uma boa parte destas congregações incute valores como ódio ao diferente, defesa da meritocracia no capitalismo e o ‘empreendedorismo’. Naturalmente, num universo tão expressivo, existem contradições importantes e variações no amplo espectro da árvore doutrinária ‘protestante’.

Ademais, o trabalho que era desenvolvido pela esquerda brasileira até os anos 1980 – “formiguinha” – o qual de forma molecular (trabalho de base) e construtiva visitava os trabalhadores nas suas residências, foi sendo substituído pela incorporação dessa mesma esquerda às superestruturas sindicais e, depois, em postos e empregos nos três poderes do Estado brasileiro, trazendo à sua militância as consequências que esse tipo de incorporação ocasiona.

Neste quadro de ausência, os trabalhos dos obreiros das Igrejas evangélicas foram intensificados, praticamente, sem a existência de um contraponto de esquerda, para não somente o recolhimento de dízimos, fonte do enriquecimento das igrejas, mas fundamentalmente para o doutrinamento e adestramento social, ocupando o espaço assistencial que o Estado burguês brasileiro deixou de ocupar.

Todos esses fatores permitiram que essas igrejas acumulassem uma imensa base social nas camadas mais pobres da sociedade brasileira. Hoje elas agregam o proletariado, nos seus cultos, nas suas atividades de militância ou culturais, um espaço que o movimento sindical chegou a tentar ocupar no final dos anos setenta e toda a década de oitenta. Isso fortaleceu o chamado ‘Mercado da Fé’, que hoje movimenta bilhões de reais por ano, com destaque às Igrejas como Universal, Mundial, entre outras.

Também as Igrejas evangélicas têm o controle de várias rádios, canais de televisão e jornais. A própria Igreja católica, tradicional aliada do Estado burguês brasileiro, possui pelos menos 181 emissoras de rádio, muitas delas controladas pelos setores carismáticos e da Canção Nova, grupos à direita na Igreja católica, que procuram disputar fiéis com os evangélicos. O poderio econômico dos evangélicos permitiu, por exemplo, o surgimento do Karpos Bank, banco digital cujo público principal é formado por igrejas e associações cristãs, sendo isso parte de toda base material deste imenso aparato religioso ligado à militância política mais conservadora, em geral.

 

O temor dos chamados setores médios e da pequena burguesia frente à crise econômica e social – cresce a extrema direita

 

No Brasil, a ampla maioria das empresas são micro e pequenas, incluindo os microempreendedores individuais (MEI). Boa parte dos microempreendedores individuais é composta de trabalhadores relativamente autônomos e que trabalha duro no cotidiano. Nos últimos anos se multiplicou a ‘Pjotização’ e uberização: boa parte crê no enriquecimento a partir dos seus empreendimentos individuais (empresários de si mesmo). Essa tem sido parte da sustentação material para a ideologia reacionária do empreendedorismo, da meritocracia, do ‘esforço individual’ e etc, que são ideologias com a qual as igrejas evangélicas e os setores mais à direita do clero católico estimulam e criam as suas bases políticas.

O desmonte dos grandes batalhões da classe trabalhadora brasileira (que lutou muito nos anos 70/80) a partir da desindustrialização, fechamento de plantas industriais e privatização de centenas de estatais, está por trás do surgimento dessa nova classe trabalhadora, atomizada, dispersa e individualista. Soma-se a isso o enfraquecimento dos sindicatos, a cooptação do movimento sindical e dos movimentos populares para a gestão do Capital, a transformação do PT, acompanhado pelos seus sócios menores, que de partido fora da ordem do regime militar se tornou um partido da ordem, gestor do capital, e que iniciou o seu percurso à direita nos parlamentos e prefeituras, passando pelos governos estaduais chegando à quinta vitória para a presidência em 2022.

Esse desmonte por “baixo” e por “cima”, fez com que frente à mesmice na gestão do Estado brasileiro (obediente ao capital financeiro e instrumento para a sangria do pagamento da dívida pública do país), o bolsonarismo e a extrema direita, com seu discurso fora da ordem só na aparência – aparentemente antissistêmico – se tornassem atraentes para setores do microempreendedores, mas também para donos de pequenos estabelecimentos setores sempre duramente atacados por juros extorsivos da banca financeira. Isso explica a impressionante ampliação do apoio eleitoral e da mobilização que estes setores desenvolvem, o que incluiu completo definhamento dos tucanos do PSDB, partido amplamente desidratado e engolido por esta onda.

Historicamente, no Brasil e no mundo, os setores médios e a pequena burguesia são segmentos não tem um programa próprio e se movem “à esquerda” ou “à direita”, dependendo da correlação de força entre burguesia X classe trabalhadora e a partir das jornadas de junho de 2013, amplos setores médios se colocaram novamente à direita, (dinâmica que já existente antes de junho) se pautando por se posicionar até fisicamente contra a presença de organizações de esquerda no movimento.

Foi em tal contexto que, ao mesmo tempo em que se constituiu como um movimento progressivo por pautas justas e de pressão política, ajudou a parir movimentos reacionários – como o MBL e o ‘Vem pra Rua’ – que navegaram oportunisticamente no movimento. De forma distorcida se fortaleceu a Operação Lava-Jato de Sérgio Moro do Judiciário e de Deltan Dallagnol do MP, que foram fundamentais no impeachment – manobra reacionária arquitetada pela burguesia e os piores setores do Congresso – de Dilma em 2016, na prisão de Lula em 2018 e na eleição de Bolsonaro no mesmo ano.

Em síntese: com o crescimento galopante da barbárie social, produto da desindustrialização e da privatização de amplos setores da economia somado ao desmonte do serviço público resultado do endividamento do Estado brasileiro com a banca financeira, o único setor que acenou com um aparente discurso “fora da ordem” para os chamados setores médios foi a extrema direita. Vale ressaltar o uso competente por este setor das redes sociais e da comunicação ousada, agressiva e arregimentadora para os interesses deles. Enquanto isso, o PT e os seus sócios menores (PC do B e PSOL) se contentaram em ser gestores do grande capital, o que também explica o porquê da penetração do bolsonarismo nas camadas médias.

 

As frações burguesas em disputa no Estado Brasileiro

 

Não é recente que existem disputas acirradas no interior do Estado burguês brasileiro entre as classes dominantes do país. Tais disputas tem a ver com a ideia de concorrência – conceito fundamental no capitalismo – e acesso às benesses a partir do controle estatal. O ataque às instituições de Brasília, em 8 de janeiro, é parte da história desta disputa. No último período foi superada a polarização/cogestão petista-tucana do poder, algo que durou duas décadas e que trazia a ideia de alternância no governo (estilo republicanos e democratas) e de submissão ao mercado financeiro e aos contratos. Esta cogestão foi rompida entre 2010-14, numa conjuntura internacional de fim do “boom” das comodities da primeira década deste século, entre outros fatores.

Setores burgueses como os do agronegócio, segmentos importantes do comércio varejista, dos meios de comunicação de massa, fabricantes de armas, mineradoras, madeireiras, expandiram os seus negócios e passaram a lutar por um protagonismo maior na condução desse Estado, apoiados na desindustrialização crescente da economia brasileira, setor industrial este, que antes trouxera o surgimento do PSDB (1987, representando o Capital) e o PT (1980, supostamente representando o Trabalho). O bolsonarismo também é uma expressão desse processo de desmonte do setor industrial e a afirmação desses setores burgueses ascendentes, com a retaguarda da maioria da coluna vertebral do Estado burguês, as Forças Armadas, as polícias e as Igrejas.

A antiga ‘dualidade/parceria’ entre tucanos e petistas foi sendo substituída por uma polarização mais acirrada entre bolsonarismo + extrema direita X petismo/lulismo + Frente Ampla: o mais provável é a repetição desta polarização nas eleições em 2026, mas não há como entender a realidade brasileira sem compreender tal contexto e caracterizá-lo corretamente.

Disputas como estas não tornam o Estado brasileiro um Estado mambembe: ao contrário, a cada crise interna, o Estado burguês brasileiro se aperfeiçoa no seu objetivo de ser o guardião das classes dominantes nativas contra a classe trabalhadora. Um exemplo disso foi o aperfeiçoamento da lei antiterrorismo após o episódio de 08 de janeiro, lei criada pela petista Dilma contra os protestos de 2013/14. Podemos incluir a elitização do parlamento burguês, pois se nos anos oitenta, a força da classe trabalhadora e do movimento social conseguiu eleger parlamentares que fizeram aprovar algumas pautas progressistas dentro de uma Constituição reacionária como a que foi a de 1988, hoje o enfraquecimento do movimento sindical e social, somado ao controle financeiro do pleito pelos setores burgueses e seus altos custos, praticamente impedem que os trabalhadores tenham voz nestes espaços de dominação de classe.

Assim, o parlamento reflete justamente o que identificamos anteriormente neste texto: enorme peso de bancadas evangélicas/cristãs, da ‘bala’ e do ‘boi’. Todas estas, em comum, são bancadas pró-sistema financeiro e, no geral, reacionárias. Um fato relativamente novo é o papel executor deste parlamento, que abocanha cada vez mais espaço no orçamento público: as chamadas ‘emendas’ representaram 27% das despesas discricionárias da União em 2024, alcançando R$ 44 bilhões (R$ 31 bilhões pagos) e a previsão em 2025 chega a R$ 58,4 bilhões. Em 2021, segundo o Portal da Transparência, foram pagos R$ 21 bilhões, o que mostra efetivamente esta escalada. 8

Mais um exemplo desse aperfeiçoamento do regime democrático burguês é o do Judiciário e sua instância suprema, o STF, que, entra ano e sai ano, vai assumindo cada vez mais um destaque na dominação estatal, mas também tem sido relevante na disputa entre as frações da classe dominante, como vimos recentemente, no sentido de garantir as eleições de 2022 e na prisão de inúmeros participantes de ‘8 de janeiro’ o que ajudou a inelegibilidade de Bolsonaro e sua acusação pela PGR por ‘tentativa de golpe de Estado’ junto com boa parte da cúpula de seu antigo governo. ‘Xandão’ é um destaque deste papel institucional claro do Supremo.

Enfim, se é verdade que temos um contexto de disputa entre frações burguesas no interior do seu Estado, este segue se aperfeiçoando para garantia da dominação de classe, mantendo a submissão do Brasil aos ditames do capital financeiro e às economias imperialistas, ponto que unifica todas as frações que estão em disputa, seja a bolsonarista, sejam as que compõem a Frente Ampla (Alckimin, Simone Tebet, Marina Silva etc), em torno de Lula, seja as que estão em plano mais secundário, conjunturalmente, como os tucanos e os setores ligados a Ciro Gomes.

Portanto, esse caráter da burguesia brasileira a torna, não somente pelo peso da economia, mas também pela conformação do seu Estado, a burguesia mais preparada no continente sul-americano. Tem sido assim quando aperfeiçoa os instrumentos de coerção do aparelho de Estado sobre a classe trabalhadora, reforçando a repressão sobre a mesma, combinado a uma maior pulverização do proletariado (nos espaços de luta, sociais e culturais) o que, por consequência, permite uma maior exploração e uma maior extração de mais valia por parte dos capitalistas.

 

Governo Lula e a oposição de extrema direita

 

Lula vence em 2022 em boa medida pelos descalabros do governo Bolsonaro especialmente na pandemia de 2020-2021. Mesmo realizando uma imensa composição política – Frente Ampla – a vitória se deu por diferença pequena, cerca de 2 milhões de votos, o que equivale a população de Curitiba ou Manaus.

Lula 3 é um governo burguês, neoliberal e aplica um programa de exploração sobre a classe trabalhadora. Optando pela ampla colaboração de classes se coloca como bastante limitado politicamente nas iniciativas e se torna refém de suas escolhas, da correlação de forças e da imensa dificuldade prara ceder concessões num cenário de um capital cada vez mais sedento e em tempos de caos climático: não estamos mais em Lula 1 ou 2. Fiel a sua cartilha, Lula 3 é apático nas iniciativas políticas e o enfrentamento é quase zero ante os desafios políticos e às contradições cotidianas: a receita é a mesma desde Dilma, ou seja, ir a direita quando pressionado, ceder espaços ao ‘Centrão’ e conciliar.

Embora tenha alguns dados positivos no campo econômico – dados macroeconômicos -, o governo amarga uma crescente desaprovação e encara o custo de vida como uma situação dramática, ou seja, tais dados não chegam à mesa dos mais pobres neste momento. Além do crescimento estável no PIB, (dados mais a frente no texto), a taxa de desemprego em dezembro de 2024 foi de 6,2%, um recorde negativo. Ainda se combina a ampliação de empregos com carteira assinada, embora muito longe de reverter a tendência de precarização analisada anteriormente. A inflação tem um relativo controle e a população ocupada média em 2024 foi de 103,3 milhões de pessoas, um aumento de 2,6% em relação a 2023 e o nível médio de ocupação em 2024 foi de 58,6%, o maior da série histórica.

Opinamos, como caracterização, que tais números positivos podem ter duração efêmera, pois não encontram lastro sólido estrutural e, assim como em 2014, pode haver um recuo e crise econômica. Ainda é muito importante ter clareza que o modelo de austeridade fiscal do super ministro Haddad é o principal limitante desta conjuntura econômica, combinado a um sistema de altos juros mantido pela equipe do BC indicada amplamente por Lula.

Ante a crise dos preços, a resposta do governo foi a redução de impostos de produtos importados, ou seja, uma medida liberal de resultados duvidosos. Não há perspectiva de intervir nos preços nem na especulação abusiva daqueles que ganham muito com o custo de vida, conforme bem descrito nas páginas iniciais do nosso 1º jornal de 2025. A iniciativa, em março, da isenção até 5 mil no Imposto de Renda é praticamente a única iniciativa popular de impacto e ainda depende das articulações com o Congresso.

Ao lado deste contexto, Lula 3 sofre intensa oposição do setor de extrema direita na sociedade, nas redes sociais e especialmente a partir do Congresso. A bancada de extrema direita em Brasília dirige as ideias e os principais movimentos deste setor na sociedade. Embora seja a principal corrente política isoladamente, tal grupo tem sofrido revezes importantes desde sua derrota em 2022. O ataque de ‘8 de janeiro’ se viu amplamente derrotado e com muitos ‘ativistas da reação’ presos ou punidos. Na sequência, Bolsonaro se tornou inelegível e depois indiciado junto com mais 33 quadros de seu governo pela PGR, em processo que pode levá-lo a prisão, embora seja de difícil prognóstico.

A extrema direita tem se debilitado, relativamente, neste contexto, mas ainda é uma força poderosa e pode se reciclar visando às eleições de 2026 que já estão amplamente pautadas em pesquisas e pela mídia. Nomes como Tarciso, Caiado, Zema e/ou Ratinho Jr podem configurar tal reciclagem da extrema direita com uma roupagem mais técnica e menos ‘grosseira’ em relação aos bolsonaros. O ato nacional de 16 de março confirma o que descreve este trecho: uma mobilização bem abaixo do esperado pelos reacionários. Num dia bonito no Rio de Janeiro, menos de 20 mil foram a Copacabana escutar Bolsonaro e sua turpe pela pauta da ‘anistia’.

Neste cenário, devemos reafirmar nossa oposição de esquerda ao governo Lula, mas sem sectarismo, tocando em questões objetivas e nos limites de seu governo e combatendo permanente a extrema direita e a ameaça que representa como política reacionária aos trabalhadores, seus movimentos e direitos. Também cabe fazer esta oposição de esquerda a partir da defesa de pontos do programa socialista e, ao mesmo tempo, defender a maior articulação possível entre os setores da esquerda socialista, fortalecer o MFSR e outras iniciativas superiores que possam surgir.

Não está descartada a possibilidade da ampliação das lutas até o final do governo Lula, lutas que podem ter o perfil de ‘junho de 2013’ muito mais do que as lutas dos anos 1980 e 1990, por tudo que desenvolvemos acima neste texto. As possíveis lutas futuras terão a cara dos precarizados – como os trabalhadores de app – e da juventude sem referências claras na esquerda (majoritariamente). Para esta possibilidade é importante estarmos preparados, pois estes setores da classe, em prognóstico, devem lutar mais no próximo período.

 

Como atuarmos dentro desse quadro adverso?

 

Todas as mudanças que passaram a classe trabalhadora, as classes dominantes e o Estado brasileiro não podem ser ignorados pela nossa militância. Esse quadro, combinado à situação de defensiva/reacionária e derrotas que passaram os trabalhadores, não só nos tem colocado como quase marginais, bem como também a toda esquerda anticapitalista (PSTU, PCB e UP são as legendas legalizadas). Nosso campo político tem influência muito reduzida, dificuldade imensa de iniciativas públicas expressivas e ainda tende a uma autofagia constante. Os resultados eleitorais tem sido pífios e refletem tal contexto mas, felizmente, neste 1º de maio foi revelada uma maior unidade na ação deste campo político e devemos estimular que isso escale.

Registre-se que aquela geração que protagonizou o maior ascenso de luta da história da classe trabalhadora brasileira (anos setenta e oitenta do século passado), se ainda viva, ou se aposentou, ou foi cooptada pela superestrutura parlamentar, do Estado ou sindical, ou, por questão de sobrevivência em função do desemprego crescente ou de perseguições políticas, teve que arrumar um emprego público, através de concurso, dentro do próprio Estado burguês. Boa parte da militância de esquerda está acima dos 50 ou 60 anos.

Em resumo: estamos bastante deslocados das mudanças para pior que aconteceram na nossa classe, seja nos lugares de trabalho, ou nos lugares de moradia e, principalmente, na consciência. É nesse retrocesso que operam o Estado burguês e seu aparato repressivo convencional ou informal, seus agentes ideológicos privados (Igrejas, meios de comunicação de massa etc) e as direções do movimento dos trabalhadores.

Estas últimas colocam que a única possibilidade de intervenção na atual conjuntura, mundial ou brasileira, é se encaixar nas disputas entre as frações burguesas, em um dos campos. Dessa forma, estaríamos com Kamala, “em defesa da democracia” contra Trump. Para alguns, dentro dessa lógica, seria defender, na guerra entre Rússia e Ucrânia, Zelensky contra Putin e para outros, Putin contra o presidente ucraniano.

Neste sentido, defender a visão da construção de um campo político, independente, e de luta da classe trabalhadora passou a ser descartado e a velha lógica do mal menor passou a ser a tônica. Não é a toa que Lula é visto como intocável por uma maioria esmagadora de velhos e novos ativistas, que vêem em qualquer crítica ao petista, uma possibilidade de brechas ao bolsonarismo, o que dificulta imensamente o nosso trabalho.

Não somos dos que igualam o bolsonarismo ao lulismo, afinal votamos e fizemos campanha para derrotar Bolsonaro no segundo turno, corretamente, e entendemos, sem sectarismo, o sentimento de vitória que ficou em muitos lutadores. Porém, isso é uma coisa. Outra é dizer que Lula e sua Frente Ampla vão governar para os explorados: ao contrário, governarão para os ricos, para as corporações, para os contratos, para o mercado e para o sistema financeiro, apesar de toda a retórica contra estes, utilizada quando conveniente.

Pouco importa se houve o crescimento da economia brasileira e o PIB nos últimos anos: 3,1% em 2022, 3% em 2023 e 3,4% em 2024, pois este crescimento não reverterá em melhorias qualitativas para imensa massa nem estará na mesa do povo trabalhador. A riqueza do país continuará sendo consumido pelo pagamento da dívida pública com o sistema financeiro.

Dentro dessa lógica é que se dá o desgaste do governo Lula, pois os espaços para concessões ao proletariado são ínfimos. A extrema-direita espera esta situação de desgaste e está não somente bem plantada socialmente, como tem sólida representação parlamentar, ocupa governos e prefeituras importantes, possui meios de comunicação de massa e tem financiamento milionário. A direita liberal idem.

Estamos mal localizados, marginalizados nesta “nova” classe trabalhadora para nos apresentar como alternativas. Mesmo que ainda existam milhões de funcionários públicos nas três esferas (federal, estadual e municipal) 9, não serão desses segmentos que virão as respostas necessárias para se construir uma base social que se contraponha à extrema direita e aos liberais, ainda que devamos participar ativamente e politicamente dos seus embates, pois são setores numerosos e importantes da classe trabalhadora, especialmente educação e saúde. Cabe destacar que a educação – pensada amplamente – é um espaço interessante e possível para a luta de ideias e o emabte ideológico.

Devemos continuar defendendo a unidade da esquerda anticapitalista, de todos os seus agrupamentos, sejam partidos legalizados ou não, desde que o marco seja estar fora e não apoiar o governo de Frente Ampla de Lula. Sabemos isso ser muito difícil pela tradição aparatista e de seita da grande maioria dos grupos que poderiam compor esta esquerda anticapitalista, reforçados pela situação de descolamento social. O MFSR é uma alternativa interessante e teve nossos esforços na sua construção neste último biênio. Infelizmente, tal movimento encontra dificuldades de consolidar-se e ocupar um espaço mais amplo num contexto no qual pode ser ampliada a militância crítica a esquerda – mais crises e rupturas mesmo que minoritárias – da colaboração de classes a partir da experiência com Lula 3. Devemos batalhar para o fortalecimento e consolidação do MFSR na perspectiva de uma maior unidade deste campo político e acompanhar e fortalecer qualquer iniciativa válida com semelhante estratégia.

O caminho oposto, ou seja, o sectarismo e o espírito de seita aparatista ajudou a implodir o Polo Socialista Revolucionário, que foi criado somente para dar suporte à política eleitoral do PSTU em 2022. Entretanto, frente às frações burguesas em disputa, à capitulação das direções de esquerda, a unidade da esquerda socialista é uma necessidade. Através dela, podemos construir ações comuns que possam tirar a esquerda anticapitalista da marginalidade o que poderá ajudar também na nossa construção ou na perspectiva de uma fusão superior – com outro (s) grupo (s) – caso isso possa ocorrer no próximo período.

 

Eixos gerais

 

– Contra a colaboração de classes – Oposição de esquerda ao governo Lula: independência de classe / contra a carestia / defesa das liberdades democráticas.

– Combate permanente contra a Extrema direita, o fundamentalismo político e o reacionarismo.

– Nem agro nem rentismo – abaixo a classe dominante.

– Contra o colapso ambiental – por uma saída anticapitalista e ecossocialista classista.

– Contra a burocratização dos movimentos sociais e sindicais – pela democracia proletária e organização pela base.

– Pela unidade e ampla articulação da esquerda socialista.

– Contra a precarização do trabalho – toda solidariedade ao proletariado dos app, terceirizados e subempregados. – Salário mínimo do DIEESE.

– Não ao pagmento da dívida pública – garantia dos investimentos nas áreas sociais.

– Abaixo o Arcabouço Fiscal e austeridade neoliberal.

– Reforma Agrária sob controle dos trabalhadores – contra o latifúndio e o modelo do ‘agro’.

 

 

 

 

Brasil, março e abril de 2025.

 

1 Fonte: https://auditoriacidada.org.br/.

2 O parâmetro internacional para medir a pobreza é uma renda de até R$ 665,00/mês por pessoa. Já para a extrema pobreza é de até R$ 209,00/mês por pessoa. Em 2023 viviam na pobreza 59 milhões de pessoas — este número gigante é o menor desde 2012 – e na extrema pobreza eram 9,5 milhões, população superior a vários estados brasileiros. Fonte: https://abrir.link/ENPQT.

3 Mais detalhes, números e gráficos em https://abrir.link/WTkcK.

4 Ver https://abrir.link/UqjNu

5 Ver https://abrir.link/NtFZL

6 Dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais, órgão do Ministério da Justiça.

7 Dados do World Prison Brief, levantamento mundial do Institute for Crime and Justice Research e da Birkbeck University de Londres.

8 Fonte: Agência Câmara de Notícias.

9 Em 2021, o Brasil tinha cerca de 11,35 milhões de servidores públicos, o que corresponde a 12,45% do total de empregados no país. A distribuição de servidores públicos entre as esferas do governo pode variar ao longo do tempo. Esfera federal: em 2023, o governo federal tinha 572 mil funcionários públicos civis. Esfera estadual: Em 2019, havia 3,4 milhões de servidores públicos estaduais. Esfera municipal: em 2019, havia 6,5 milhões de servidores públicos municipais.

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