O desmantelamento do POUM
A partir do desenrolar da Guerra Civil Espanhola, a burocracia soviética envia à Espanha cada vez mais contingentes para intervir no conflito. Não é exatamente verdade que a URSS stalinizada abandonou a Espanha para as mãos fascistas, mas o centro da política estalinista era a restauração ‘democrática’ e aliança com Inglaterra e França, países desconfiados do ‘perigo vermelho’ espanhol. A prioridade era a defesa do regime ‘democrático’ e, no máximo, a garantia de um reformismo republicano.
Gradualmente, a dualidade de poderes existente na Guerra Civil foi desmontada por dentro: era a política deliberada do PSOE e PCE e respaldada pelas direções sindicais majoritárias e pelo próprio POUM a partir de suas práticas vacilantes e centristas combinadas a um espírito combativo.
Um exemplo de tal estratégia foi verificado nas batalhas de maio de 1937, quando o governo republicano tenta assumir o controle das comunicações ocupando o edifício da Telefônica, em Barcelona. A classe trabalhadora enche a cidade de barricadas e a militância da CNT (central sindical) e do POUM dominam a situação, mas logo chama a desmontar as barricadas e a voltar a confiar na política oficialista da Frente Popular. Mais uma vez o POUM não se atreve a romper com o governo e desmobiliza sua própria base no meio da batalha. Assim, as barricadas vão se dissolvendo e o governo recupera o controle.
Após esta bela colaboração evidente com as forças governistas, o partido seria ilegalizado sob a acusação absurda de “fascista”; seria este o prêmio pela colaboração centrista frente ao governo. Andreu Nin seria sequestrado e torturado até a morte pelo estalinismo. Milhares de anarquistas, poumistas e trotskistas são executados ou presos pela ação repressiva da Frente Popular, especialmente com a ação da NKVD. (1)
Ao fim e ao cabo, para a alegria de Franco e do fascismo internacional, quem reprimiu e eliminou milhares de lutadores da esquerda foi a esquerda tradicional: o PC e o PS espanhóis com apoio burocrático-soviético. Muitos militantes adentraram na clandestinidade para fugirem do governo e dos assassinos enviados por Moscou. Mesmo leal a Frente Popular, enfim, o POUM foi desmantelado enquanto os fascistas avançavam militarmente ante uma esquerda dividida e sem norte revolucionário. (2)
Não foram os fascistas, portanto, que reprimiram e mataram milhares de militantes de esquerda. Seria o fim trágico do centrismo do POUM e, mais tarde, o fascismo venceria a Guerra Civil inaugurando um longo governo reacionário. O violento conflito de quase três anos deixou um país destruído e mais de 500 mil mortos sendo para muitos a antessala da Segunda Guerra Mundial.
A vitória fascista na Espanha
Em janeiro de 1939, os falangistas entraram em Barcelona e, em 23 de março, Madri rendeu-se depois de poderosos ataques, inclusive de aviões nazistas. Logo, as nações “democráticas” como os Estados Unidos reconheceriam o governo fascista e golpista de Francisco Franco que assumiria a ditadura – com aspectos monárquicos embora sem um rei oficialmente – até sua morte em 1975.
O POUM, por sua vez, entrou para a história pela sua breve existência em um contexto extraordinário, no qual teve erros e acertos. Uma situação radicalmente polarizada e com oportunidades tanto para a revolução socialista como para o fascismo, mas marcada por uma situação internacional muito desfavorável – ascensão de fascismo em vários países e do estalinismo na URSS – que ajudou a selar o terrível desfecho para o partido e, especialmente, para a classe trabalhadora espanhola por décadas.
Notas
¹ NKVD, em russo Narodniy Komissariat Vnutrennikh Diel, era o Comissariado do Povo de Assuntos Internos. Criado em 1934, o NKVD incorporou funções centrais na administração e na segurança do Estado. Cabia ao NKVD controlar a economia e o serviço secreto, prestando contas ao Conselho de Comissários do Povo e ao CC do Partido Comunista. A NKVD administrava os chamados Gulag e os campos penais de trabalho, famosos por incluir os perseguidos políticos como criminosos. Teve forte presença na Guerra Civil Espanhola e seus agentes atuavam em conjunto com o PC Espanhol exercendo influência sobre o governo republicano. O NKVD estabeleceu prisões secretas em Madri, onde torturou e matou centenas de oponentes (nacionalistas espanhóis, católicos, anarquistas e trotskistas). A partir de maio de 1937, diversos revolucionários foram presos sob as mais diversas acusações, geralmente falsas.
² Assista ao filme “Terra e Liberdade”, dirigido por Ken Loach, 1995.
No Youtube, acesse o link – https://www.youtube.com/watch?v=_cVCg08fZiA




